segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Linhas Aéreas Marginais

Sempre disse que o jeito GOL de fazer negócios tinha um quê de marginal. Bingo! Parece que não me enganei. Ver Nenê Constantino agredindo um repórter foi, no mínimo, constrangedor. Mas não quero falar apenas em jogar pedra em repórter. A coisa toda é anterior.

A explicação, a meu ver, está no DNA marginal da empresa, que tem como sponsor, Constantino, dono também de 36% da frota de transporte público que circula em Brasília.

Já que mencionei DNA e Brasília, vale recordar que nos áureos tempos da construção da cidade projetada por Niemeyer, era ele, o próprio Nenê, que circulava por lá fazendo o transporte dos operários. Ou seja, a relação Nenê – Brasília começou cedo, nasceu junto com a cidade e, pelo visto, os vínculos vêm se estreitando cada vez mais... Parece que o cordão umbilical não foi rompido. Cá entre nós, dizem que com o dinheiro gasto para construir a Capital Federal daria para construir outras duas. Onde está esse dinheiro não cabe a mim responder, mas o camarada que participou da construção disso tudo tem hoje uma das maiores fortunas do país, é dono de frotas de ônibus e, se não bastasse, dono também de uma bela frota de aviões, uma vez que sua GOL decolou no mercado da aviação civil e tratou de acabar com algumas de suas maiores concorrentes, dando o pontapé inicial na crise aérea que hoje preocupa o país.

As empresas aéreas que resistiram foram forçadas a seguir o modelo, era uma questão de sobrevivência e, assim, instituiu-se o caos nos céus do país. O preço baixo hoje praticado pelas empresas aéreas é ilusório, pois pode custar o atraso na reunião, a perda do fechamento no negócio, o cancelamento de um contrato e, na pior das hipóteses, até mesmo sua vida. Esse modelo GOL de fazer aviação pode ser barato, mas o preço baixo é insalubre. Não adianta querer dominar o espaço aéreo sem ter condições de suprir a demanda que, com o baixo preço, só poderia aumentar. Calma, calma... O modelo de gestão de infra-estrutura aérea intervencionista auxilia no caos, é claro.

Não bastasse isso, Constantino responde por crime de corrupção ativa e inquéritos sobre fraudes no BRB, Banco de Brasília. Será ele condenado? Não sei, mas que pegou mal Nenê Constantino agredir um repórter quando chegava para depor, ah, isso pegou. Esse maldito DNA marginal...

Por analogia, diria que a GOL é um belo exemplo de pirataria aérea. Você recebe o produto, paga menos por ele, mas em compensação, come alpiste, anda espremido, faz escala onde piscar a primeira luz e corre o risco de passar por toda uma sorte de humilhações que não merecem ser aqui descritas. Linhas aéreas inteligentes... Belo slogan, mas talvez fosse mais representativo e verdadeiro a troca do adjetivo inteligentes para obtermos, quem sabe, linhas aéreas espertalhonas, linhas aéreas apadrinhadas ou, deixo ainda a sugestão de linhas aéreas marginais, a melhor maneira de definir o perfil da empresa.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Dependente químico: vítima ou algoz?

Tropa de Elite é o assunto em voga nos últimos dias... Capas de revistas, denúncias de pirataria e todo o blá blá blá que acompanha uma estréia aguardada.

Uma das sacadas do filme, que vêm sendo fomentada com exegero pela mídia, é a sugestão de culpa da sociedade pelo tráfico de narcóticos, na figura de seus dependentes químicos. Ou seja, todos somos suspeitos de crime, eu, seus vizinhos, seus amigos e, nem pense em escapar dessa, a culpa pode ser sua também!!!

Eureka! Então podemos dizer que a solução de tudo é acabar com os drogados! Isso, vamos prender todos os dependentes químicos! Eu sabia...é culpa da classe média...de novo...ela deve estar querendo se vingar dos tributos obcenos que tem de pagar...ou do sofrimento nos aeroportos...

Ora, que ingenuidade pensar assim. Os alucinógenos fazem parte da cultura do ser humano desde os tempos idos. Não importa credo, nacionalidade ou cor, uma parcela das pessoas sempre terá tendência à drogadição.

Não quero isentar o consumidor final de droga de estar cometendo um crime. Comprar e portar essas substâncias é ilegal e ponto. Todavia, insinuar que a resolução ou causa do problema de violência nas perifierias está do lado do drogado, é cômodo demais! Uma família que já carrega o peso de ter um filho usuário de drogas, merece carregar ainda a culpa dos genocídios nas favelas? Afinal, será essa família vítima ou algoz?

Sejamos práticos. É utópico pensar que uma classe social com razoável poder econômico não vá gerar demanda de consumo de entorpecentes. Vale lembrar que até os índios, em sua organização tribal, consumiam drogas (que o diga Iracema, guardiã do segredo da Jurema).

A diferença fundamental é que os índios eram controlados pelo seu Estado – entenda-se aqui pajé -, já nós, por outro lado, estamos desprovidos de controle, punição, regulamentação. O nosso Estado está falhando. Deixou-nos abandonados à própria sorte!

Não podemos aliviar o governo da responsabilidade de resolver o problema, pois essa é fundamentalmente a sua função. Não é refinar petróleo, não é administrar aeroportos, não é usar dinheiro do contribuinte para pagar pensão... A função do Estado é zelar pelas suas crianças, educá-las para que prefiram um livro a uma AR15b; é usar de coerção; é estar presente nas favelas. Esse jogo de empurra empurra é cansativo e nojento. Já é chegada a hora de cada um assumir seus deveres e colocar as cargas de reponsabildade sobre os ombros certos.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

A Cruzada do Bispo

Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus e dono da Rede Record, deu ontem um passo importante em sua cruzada rumo à primeira posição no ranking das emissoras de TV do Brasil.

Foi exibida por sua emissora uma extensa reportagem sobre a prisão do "bispo", ocorrida há quinze anos. A reportagem conteve dramatização de cenas, ataques à Globo e uma longa entrevista com o próprio Edir Macedo, dessa vez com falas mais mansas, amparado pela carapuça de vítima.

Vejo que o arranhão à imagem de Edir, causado não só por sua prisão, mas por alguns vídeos (mostrando orgias praticadas por membros do alto staff da Universal), à época largamente divulgados pela imprensa laica, é um dano que precisa, incondicionalmente, ser reparado para que a Record galgue o posto de maior do Brasil. E essa é a grande batalha da cruzada, que por coincidência ou não, escolheu o feriadão de Nossa Senhora Aparecida, aquela que outrora fora chutada por um pastor da I.U.R.D, para iniciar.

Como todo bom mestre em retórica, Edir Macedo valorizou na entrevista alguns argumentos específicos, que não diziam respeito exatamente à causa da prisão, como por exemplo a forma violenta com que, na frente de sua família, fora abordado e capturado pela polícia paulistana em maio de 92. Na reportagem, também é exibida uma conversa com Edir na prisão em que passou 11 dias. Nesse cenário, ele habilmente compara o seu sofrimento ao martírio dos apóstolos de Cristo.

O pano de fundo da matéria é o anúncio do lançamento do seu livro, intitulado O Bispo – A História Revelada de Edir Macedo. A biografia autorizada, escrita por Douglas Tavolaro, diretor de jornalismo da Record (e, portanto, funcionário de Edir) chega hoje às prateleiras das livrarias. O livro ressalta novamente o aspecto da martirização, evidenciando as agonias da prisão e a execração pública a que fora submetido.

Edir também se defende das denúncias de estelionato, dizendo que sua Igreja prega a Teologia da Prosperidade: “Se Deus, o meu pai, é rico, seria injusto que eu não fosse rico também”. Sei que os fiéis da Igreja Universal também se ajudam entre si. Dificilmente encontraremos um seguidor desempregado. Ou seja, o que Edir Macedo chama de Teologia da Prosperidade, eu chamaria de seita-consórcio ou, quem sabe, de networking santo.

De quebra, o livro, trará uma renda extra para os caixas da Universal. Afinal, pelo menos a venda de um exemplar por fiel está garantida: já arranca de Best Seller! Só para ter idéia da abrangência disso tudo, vale lembrar que o Mac Donald’s marca presença em 118 países, pouco para Edir, cuja Igreja já se consolidou em 172 países!

O forte poder de persuasão do homem, inlcusive, me convenceu a comprar meu exemplar. Lerei e comentarei aqui no blog. Enquanto isso, esperemos pelo próximo capítulo dessa cruzada do bispo.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Teria o gerúndio imunidade parlamentar?

Vamos estar admitindo que não há como lutar contra o gerúndio.

A despeito da demissão do gerúndio pelo governador José Roberto Arruda, o cargo dessa pobre locução verbal está mais garantido que o de Renan Calheiros.

Quando falo que a guerra contra o gerúndio está perdida, tomo por base dois olhares sobre nosso atual cenário. O primeiro, e menos preocupante, é o sentido dado pelo governador Arruda, e quanto a isso não há por que explicar as razões da derrota. Ou alguém aposta que os políticos do Distrito Federal irão parar de nos enrolar de uma hora para outra? Ou que a máquina estatal irá cassar o mandato dos gerúndios em virtude de um simples decreto emitido por quem, outrora, esteve fraudando o painel eletrônico do senado?

Visto isso, o alerta maior diz respeito à invasão do gerúndio em nossa língua. Aí temos que tomar cuidado para não confundir gerúndio com gerundismo. O primeiro é uma locução verbal correta e largamente utilizada em nossa língua. O segundo, esse sim perigoso, é o uso sistemático e exagerado de verbos no gerúndio, e tem se alastrado como praga pelas corporações, repartições públicas e vem entrando em nossas casas como se convidado fosse. Claro, assim como a ineficiência pública, o gerundismo irrita. Apesar de gramaticalmente correto, ele não é um termo originalmente nosso como expressão de linguagem. Foi chegando de mansinho na carona de corporações americanas (principalmente operadoras de cartão de crédito) na forma de equivalência semântica... Um anglicismo disfarçado! Porém, foi ganhando força e se transformou em vício de linguagem, sendo usado quase em tom de eufemismo.

Não quero entrar no mérito lingüístico da coisa, mas a verdade é que o gerundismo chegou para ficar. E não é uma questão de relevância gramatical, lexical ou etimológica, mas sim econômica. Nem que se façam campanhas, se redijam decretos ou se reformem a gramática, o gerundismo irá de volta para a terra do tio Sam.

Sabemos que a língua é viva e também sofre com a relação de dominação. O português vem perdendo acentos e incorporando novas letras ao seu alfabeto, tais como Y, W e K. Todos os setores sentem o efeito da globalização. Na língua isso não seria diferente. A forma como falamos hoje é reflexo da dominação romana sobre a Europa, e da conseqüente imposição de seu latim aos povos dominados. Podemos até corrigir um filho ou um colega sobre o mau uso dos gerúndios, mas não há como lutar contra movimentações econômicas em escala mundial.

Um outro exemplo da força do argumento econômico sobre a língua é a formação dos blocos de países. Note que a América Latina não é assim classificada por causa da língua, mas sim por ser formada por um bloco de países em desenvolvimento e com economias afins. Reparem que não existe a terminologia “Europa Latina”, mas também não há um argumento econômico relevante que segregue a Inglaterra da França, por exemplo. Ou seja, a afinidade econômica será sempre mais forte que a afinidade lingüística.

Então, já que não há como lutar, deixemos os gerúndios em paz e tratemos de cuidar de nossas vidas. Afinal nós sim, reles mortais, estamos sujeitos à demissão.