segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Teria o gerúndio imunidade parlamentar?

Vamos estar admitindo que não há como lutar contra o gerúndio.

A despeito da demissão do gerúndio pelo governador José Roberto Arruda, o cargo dessa pobre locução verbal está mais garantido que o de Renan Calheiros.

Quando falo que a guerra contra o gerúndio está perdida, tomo por base dois olhares sobre nosso atual cenário. O primeiro, e menos preocupante, é o sentido dado pelo governador Arruda, e quanto a isso não há por que explicar as razões da derrota. Ou alguém aposta que os políticos do Distrito Federal irão parar de nos enrolar de uma hora para outra? Ou que a máquina estatal irá cassar o mandato dos gerúndios em virtude de um simples decreto emitido por quem, outrora, esteve fraudando o painel eletrônico do senado?

Visto isso, o alerta maior diz respeito à invasão do gerúndio em nossa língua. Aí temos que tomar cuidado para não confundir gerúndio com gerundismo. O primeiro é uma locução verbal correta e largamente utilizada em nossa língua. O segundo, esse sim perigoso, é o uso sistemático e exagerado de verbos no gerúndio, e tem se alastrado como praga pelas corporações, repartições públicas e vem entrando em nossas casas como se convidado fosse. Claro, assim como a ineficiência pública, o gerundismo irrita. Apesar de gramaticalmente correto, ele não é um termo originalmente nosso como expressão de linguagem. Foi chegando de mansinho na carona de corporações americanas (principalmente operadoras de cartão de crédito) na forma de equivalência semântica... Um anglicismo disfarçado! Porém, foi ganhando força e se transformou em vício de linguagem, sendo usado quase em tom de eufemismo.

Não quero entrar no mérito lingüístico da coisa, mas a verdade é que o gerundismo chegou para ficar. E não é uma questão de relevância gramatical, lexical ou etimológica, mas sim econômica. Nem que se façam campanhas, se redijam decretos ou se reformem a gramática, o gerundismo irá de volta para a terra do tio Sam.

Sabemos que a língua é viva e também sofre com a relação de dominação. O português vem perdendo acentos e incorporando novas letras ao seu alfabeto, tais como Y, W e K. Todos os setores sentem o efeito da globalização. Na língua isso não seria diferente. A forma como falamos hoje é reflexo da dominação romana sobre a Europa, e da conseqüente imposição de seu latim aos povos dominados. Podemos até corrigir um filho ou um colega sobre o mau uso dos gerúndios, mas não há como lutar contra movimentações econômicas em escala mundial.

Um outro exemplo da força do argumento econômico sobre a língua é a formação dos blocos de países. Note que a América Latina não é assim classificada por causa da língua, mas sim por ser formada por um bloco de países em desenvolvimento e com economias afins. Reparem que não existe a terminologia “Europa Latina”, mas também não há um argumento econômico relevante que segregue a Inglaterra da França, por exemplo. Ou seja, a afinidade econômica será sempre mais forte que a afinidade lingüística.

Então, já que não há como lutar, deixemos os gerúndios em paz e tratemos de cuidar de nossas vidas. Afinal nós sim, reles mortais, estamos sujeitos à demissão.

5 comentários:

Gilberto Porcidonio (Puppet) disse...

E assim o "Present Continous" vai ganhando cada vez mais espaço...




Sobre o post passado:

"Ok, os circos precisavam evoluir. Já não mantêm animais em cativeiro nem maltratam os pobres bichinhos. Todavia o palhaço não está mais no palco."


Este comentário foi simplesmente SENSACIONAL!

Passarei mais por aqui.
Abraços!

analise ia disse...

Se já confundo as regras de gramática, agora então...

Unknown disse...

Já vi muita gente não-especialista falando que o gerundismo é um empréstimo do inglês.

Pode ser que a história que contam das más traduções de manuais de telemarketing seja até verdade, mas eu nunca vi uma investigação sistemática a respeito para verificar se sua origem é essa mesmo.

Por este motivo, eu estou cético quanto a tal origem. Suspeito fortemente de que essa história é um caso de "folk etymology" (etimologia popular) e que na verdade o gerundismo tenha surgido no seio lusófono mesmo, sem influências do inglês.

Acho até que essa história ganhou força porque foi espalhada pelo Pasquale, um completo leigo em Lingüística que, apesar disso, é um professor de português razoável e tem bom espaço na imprensa (por mérito dele). Entretanto, dessa vez acho que ele falou bobagem.

Em um país no qual uma parcela ínfima da população fala inglês, acho extremamente improvável que uma construção gramatical daquela língua conseguiria se espalhar de forma tão rápida assim.

Outra coisa também: até hoje não estou convencido de que o gerundismo seja tão "nocivo" e "perigoso" assim para a língua. Não sou defensor do gerundismo, mas me parece que os ataques a ele ocorrem somente porque ele não é acolhido pelo padrão e porque a "polícia da língua" o pegou para Cristo. Por que ele seria tão "nocivo" assim?

Se você souber de algum artigo publicado em periódico ou congresso na área de Lingüística que descreva o processo que causou o surgimento do "gerundismo", contacte-me por e-mail:
antonielly (arroba) antonielly.com

Antonio João disse...

Gostei do teu Blog, vou adiciona-lo aos meus favoritos.

O Gerundismo pode não ser nocivo, mas que enche, enche.

As pessoas o usam para estarem antenados, na moda.

Unknown disse...

Olhem, também não sei de certo a origem do tal gerundismo, o que sei é que incomoda bastante e, que não precisamos d'ele pra nada, pois temos tempos verbais suficiente para todas as necessidades.

no entanto, sou obrigada a concordar que dificilmente nos livraremos do mesmo, pois cada dia que passa mais pessoas são contagiadas, acho que pra ficarem atualizadas, não sei.